Do 'tomar e comer' ao 'ver'
a perda do real sentido eucarístico e seus desdobramentos pastorais.
DOI:
https://doi.org/10.46525/ret.v38i1.1776Resumo
A Igreja Católica Apostólica Romana crê e prega que no pão e no vinho, frutos da terra e do trabalho humano, acontece o milagre da transubstanciação, ou seja, a partir do momento da consagração, na qual quem preside atualiza o sacrifício de Cristo, a essência da matéria – pão e vinho – muda: já não se tem mais pão e vinho, e sim Cristo, presente real e verdadeiramente tal qual está no céu. Quando o fiel o recebe, esgota-se o princípio de alteridade, uma vez que aquele que comunga passa a ser um só com Cristo. Esta é, em linhas gerais, a essência do dogma eucarístico. Todavia, como resquício de uma sociedade puramente imagética, este, que é o coração da Igreja, tem perdido o seu caráter primordial de refeição [=tomar e comer] para se transformar em mera contemplação [=ver]. De fato, para alguns, parece ser mais importante ver a hóstia consagrada (e o que ela contém!), do que propriamente tomar e comer. Esta tendência, por sua vez, tende a criar dificuldades ainda maiores, porque, por exemplo, já não importa a celebração em si, mas sim quem a presidirá e com que finalidade (bênçãos, curas, libertações). Além do mais, cria uma fé totalmente descompromissada com a vida, visto que o “tomar e comer” traz sérias implicações para a ética cristã, ao passo que o “ver” pode trazer, tão somente, uma espécie de “alívio instantâneo”, a ponto de, dali não muito tempo, o fiel necessitar outra vez “olhar”. Esse tipo de prática, além de não favorecer formação religiosa adequada, incentiva o comércio religioso: volta-se à época dos ostensórios, das pompas e do culto à personalidade dos presbíteros. O objetivo, portanto, é demonstrar o quanto esta perda de sentido, por mais que consiga reunir as massas, prejudica diretamente a ação pastoral da Igreja, porque induz a uma fé infantil.